terça-feira, 21 de outubro de 2014

Bad Religion 5 - Suffer (1988)

Nota: 9

A icônica capa de Suffer
Sabe como você muda, revitaliza e influencia toda uma cena musical em pouco mais de 26 minutos? “Suffer”! Segundo Fat Mike, lendário vocalista do NOFX, este disco do Bad Religion foi o responsável por “mudar tudo”! E ele certamente estava se referindo às profundas mudanças de conceito e estética sonora que o “Punk Rock” sofreu após o lançamento de “Suffer”.

Sabe aquele som Punk bem cruzão, agressivo, cortante, com 3 ou 4 acordes no máximo, e com melodias bem primárias, ou até mesmo, sem nenhuma melodia? Até “Suffer” ser lançado em 8 de setembro de 1988 pela Epitaph Records, gravadora do próprio guitarrista da banda, Mr. Brett (sim, do-it-yourself!), o Punk Rock de verdade (o contestador, e não aquele com “letras-pra-pegar-mininha”) não era nada melódico, não tinha muitos acordes e estruturas musicais mais elaboradas e, muito menos, coros de backing vocals com harmonias em 3 vozes em tons diferentes.

E essas são as principais características deste segundo full length do Bad Religion, acrescidas ainda de um inexplicável, porém perceptível, “ar californiano” que permeia todas as velozes 15 faixas do play, que juntas somam poucos, porém certeiros, 26 minutos, sendo a menor, “Pessimistic Lines”, com 1:07, e a maior, “What Can You Do(o som do BR favorito de Tim Armstrong, do Rancid), com 2:44.

A banda estava parada desde o fim de 1985 e só se reuniu novamente no meio de 1987 para compor “Suffer”. A formação contava com os compositores Greg Graffin (v) e Mr. Brett (g), seus asseclas do 1º disco Jay Bentley (b) e Pete Finestone (d), e o responsável pela “sobre-vida” da banda no meio da década de 80, Greg Hetson na outra guitarra.

Line-up de Suffer, em 88: Brett (g), Pete (d), Hetson (g), Bentley (b) e Graffin (v)
Eles levaram apenas 8 dias, em abril de 1988, para gravar e mixar o disco no estúdio Westbeach Recorders, também de propriedade do guitarrista Mr. Brett (mais do-it-yourself nessa história!), que foi o engenheiro de som na gravação (seu novo “emprego” pós largar o vício em crack), além de produzir a bolacha junto com o resto da banda. Entre os fatos curiosos da gravação, que foi vitoriosa em tirar um som bem limpo e audível, sabe-se que Jay Bentley gravou o baixo com um amplificador de guitarra Hiwatt SA212, método que acabou empregado em quase todos os discos do BR desde então.

O impacto pelo novo jeito de fazer Punk Rock, ainda rápido, agressivo e com letras ainda mais contestadoras, porém cheio de melodias e harmonias vocais, foi tão grande que “Suffer” vendeu 3 mil cópias logo de cara no 1º ano, sendo que permaneceu como o campeão de vendas (no 1º ano) do selo Epitaph até 1994, quando foi desbancado pelo nada mais, nada menos clássico “Smash”, do The Offspring. No Brasil, “Suffer” só foi editado oficialmente em 1998, 10 anos após seu lançamento, em CD, pela gravadora Paradoxx Music.

Blusão com o "garoto queimando"
A icônica capa, desenhada pelo artista Jerry Mahoney, se tornou lendária ao trazer um típico adolescente no subúrbio americano, literalmente pegando fogo de raiva, ou “sofrendo”, fazendo alusão ao título do disco. O “garoto queimando”, mesmo não se tornando um “mascote” oficial do Bad Religion, acabou sendo muito utilizado em artes de camisetas e, principalmente, em tatuagens feitas por fãs.

O guitarrista Mr. Brett disse, em entrevistas, que o conceito lírico de “Suffer” (tradução “sofrer”) vem do escritor Fyodor Dostoyevsky, em não encarar o sofrimento como uma coisa ruim, mas sim como um fator de onde o ser humano sai “purificado”. Já do lado da outra força criativa da banda, o vocalista e professor universitário Greg Graffin, as letras escritas por ele, além da contestação pura e direta, começaram a abordar assuntos acadêmicos e Ciência propriamente dita, temas que passaram a ser recorrentes no resto do catálogo da banda a partir de então, e que te obrigam a usar bastante um dicionário para entender algumas vezes (rs).

Encarte com as letras pintadas na parede do quarto do baixista
Se historicamente “Suffer” foi um divisor de águas para a cena Punk nos EUA, musicalmente ele inventava, sem querer-querendo, um novo estilo, com músicas velozes, com pouco mais de 1 minuto de duração, compostas seguindo harmoniosamente as escalas das notas musicais (a sequência “dó-ré-mi” é bastante utilizada), cheias de melodias fáceis de cantar e assobiar, que agradavam não só os punks fãs de contestar o sistema, mas também um público mais jovem, incluindo uma boa parcela de skatistas e aficcionados em esportes radicais em geral.

You Are (The Government)” abre o play com os dois pés no peito, montada em uma estrutura que vai direto ao ponto, com verso-verso-refrão-fim abrupto em 1:21 de música, que te faz dar um repeat logo em seguida, pra ver se você entendeu direito que é realmente “só isso” que é necessário pra fazer musica cativante!

Contracapa da versão em CD
O lado A do vinil também traz as empolgantes “Give You Nothing”, com sua levada “surf” e letra brutalmente humilde (“Então você tem um lugar que pode chamar todo seu, mas isso se tornou em um hábito de carregar uma cruz.”), e a cadenciada “Best For You”, com seu ritmo “punk 77” perfeito pra pogar e a participação das guitarristas do L7 (outra banda da gravadora Epitaph na época) Donita Sparks e Suzi Gardner no solo do final.

A pessimista faixa-título, tocada nos shows até os dias de hoje, abre o lado B com suas cacofonias, preparando terreno para a mais hardcore de todas, “Delirium of Disorder”, o único som que lembra o estilo de Punk Rock mais sujão praticado pelo Bad Religion no início da carreira.

Foto da arte do vinil, com o BR posando em frente ao CBGB, em NY
Part II (The Numbers Game)”, que contou com a participação de outra integrante do L7, Jennifer Finch, nos backing vocals, vem na sequência e tem uma das letras mais surpreendentes. Quando li pela 1ª vez achava que era uma letra facista e arrogante no meu entendimento de Inglês aos 16 anos de idade. Só alguns anos depois saquei a brilhante ironia por trás da letra, que é cantada como se fosse um hino ou um discurso de um líder político americano, que exalta a política imperialista de dominação e opressão de seu país de forma bem irônica, assim como o BR fez anos mais tarde em seu maior hit, “American Jesus”, que só saiu em 1993, no disco “Recipe For Hate”.

"Suffer" ainda conta com o hino hardcore “Do What You Want” e sua letra “totalmente foda-se” (“Faça o que quiser, mas não faça perto de mim (...) Faça o que for preciso, faça o que puder, quebre todas as regras e vá pro inferno com o Superman, morrendo como um herói!”), talvez o maior sucesso do play e uma das favoritas de todos os tempos pelos fãs da banda.

Bad Religion ao vivo, circa 89
Depois que “Suffer” saiu, a gravadora Epitaph virou referência nesse estilo de Punk Rock com cheiro de California e um monte de melodia, lançando os primeiros álbuns de bandas que mais tarde se tornaram seminais, como The Offspring, Pennywise, Rancid, Down By Law, entre outras. Uma nova cena havia sido inagurada e o Bad Religion era o ponta-de-lança, referência máster, tanto musicalmente, como mercadologicamente, com o guitarrista Brett capitaneando a Epitaph, lançando, produzindo e, consequentemente, profissionalizando cada vez mais bandas do estilo.

Com o sucesso de "Suffer" no underground, a carreira do Bad Religion, que estava estagnada apenas aos EUA até então, virou internacional, com a banda fazendo sua primeira tour na Europa em 1989. E a vibe pelo lançamento de algo tão influente foi tão forte, que eles logo entrariam em estúdio novamente para registrar, nos mesmos moldes, o sucessor, o não menos clássico “No Control”, que será comentado no próximo post. Até lá! ;)

Escute "Suffer" logo abaixo:



6 comentários:

  1. ótimo review, cara. segue com mais. abraço!

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  2. Muito bacana você busca bem as referências, no meu ponto de vista uma banda de punk rock que é o estilo que eu mais amo , não apenas toca mas transforma vidas.

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