terça-feira, 14 de abril de 2020

Bad Religion 13 - The New America (2000)


Nota: 7

Quando você desce até o fundo do poço, o único caminho que resta é subir novamente! Talvez, inconscientemente influenciados pelos resultados pífios de seu disco anterior, “No Substance” (1998), o Bad Religion decidiu que era hora de dar uma renovada legal no seu som para o seu próximo esforço fonográfico. Dito isso, pode-se ter uma idéia de como “The New America”, o 11º álbum de estúdio dos californianos, ficou do jeito que ficou: pomposo, carregado demais na produção e com um acento Pop fortíssimo!

Também aconteceu de ser o último disco previsto no contrato com a Atlantic Records, e Greg Graffin e sua trupe aproveitaram bem as últimas “regalias” que estar assinado com uma major pode oferecer. Para produção, eles escolheram o old school Todd Rundgren, um tiozão famoso por emplacar alguns hits do Pop Rock dos Anos 70 (como “I Saw The Light”) e por produzir nomes como Badfinger, New York Dolls, Meat Loaf, entre outros.

Todd Rundgren e Greg Graffin no estúdio
Graffin provavelmente teve um grande dedo nessa escolha, já que ele sempre foi declaradamente super fã de Rundgren, e havia mandado seu disco solo “American Lesion” para que ele escutar antes de se acertarem para o disco do BR. “Ele fazia música Pop, mas de um jeito que você não ouve no rádio”, justificou o frontman, já entregando o direcionamento que o Bad Rleigion estava tomando ao fechar com um “produtor Pop”. “Muito da minha identidade musical na juventude esteve conectada com o jeito que ele se comportava.”



GRAVAÇÃO
Aproveitando os benefícios do “pacote gravadora major”, em setembro de 1999 a banda viajou para o Havaí, onde Rundgren morava, para seis semanas de gravação, com intervalos para surfe (Jay), curtição na ilha (Brian e Hetson) e ecoturismo (Graffin). Um galpão de um casal de idosos, nomeado no disco como ‘Victor’s Barn’, em Kauai, foi alugado para que a banda pudesse ensaiar e gravar algum material.
BR com Todd Rundgren no estúdio
Só que essa proximidade com o produtor, para uma banda Punk acostumada a fazer tudo por si mesma desde sempre, azedou o caldo. “Não sentia que estávamos chegando a algum lugar, assim como o Greg”, revelou, anos depois, o baixista Jay Bentley (sempre ele dando a real!). “Todd não gostou do Greg e isso deixou Greg muito puto, pois ele conheceu seu ídolo de perto e ele era um cuzão.” No entanto, quando publicou seu primeiro livro, em 2010, Graffin escreveu que ele e Rundgren são amigos apesar dos pesares.

Brian Baker trabalhando no Havaí
Além do clima pesado na gravação, Rundgren decidiu captar o disco todo direto no computador, usando o Pro-Tools, fato que desagradou o guitarrista Brian Baker, que nem se preocupou muito com seus timbres e guitarras, uma vez que “quando vai direto pro computador, pouco importa.”

Já Greg Graffin achou que Rundgren deu mais pitacos nas letras que o vocalista escreveu, com a sugestão de mudar o tom do discurso de “punk pessimista no future” para “punk otimista ativista”, o que trouxe uma atmosfera mais leve ao conteúdo do álbum. A banda também optou por mudar o esquema de produção e relação ao disco anterior, trazendo muitas demos prontas para trabalharem juntos no estúdio.

LANÇAMENTO
The New America” acabou sendo mixado e masterizado em Los Angeles, por Bob Clearmountain (que mixou “Born in the USA” do Bruce Springsteen), ficando pronto somente em fevereiro de 2000, para ser lançado em 24 de maio de 2000. Logo de cara, o disco entrou na parada da Billboard 200 na 88ª posição. Seria o disco de aniversário de 20 anos da banda, o primeiro no novo milênio, mas Greg e Jay optaram dizer que era “apenas mais um álbum”.

Capa original lançada na versão europeia
Foram feitas duas capas diferentes: a original era uma pintura do artista Joe Murray mostrando três crianças saudando a bandeira americana com armas nas mãos. Mas ela acabou sendo considerada muito agressiva pela gravadora, que produziu outra versão para o mercado americano (e que acabou saindo aqui no Brasil), com uma montagem bem simplista de helicópteros sobrevoando casas. A imagem também foi usada como backdrop do palco na tour que se seguiu ao disco.  E quem comprou o disco na primeira semana de vendas nos Estados Unidos ganhou um ingresso para qualquer show na turnê americana.

RECEPÇÃO
A roupagem mais Pop e acessível de “The New America” gerou grande controvérsia entre os fãs e entre os próprios membros da banda. Do lado dos fãs, Fat Mike, líder do NOFX e grande fã do BR, falava abertamente nos shows de sua banda na Warped Tour 2000 que o disco era “uma bosta”. Já entre os membros do BR, enquanto Greg se justificava dizendo que “algumas bandas tem medo de mudar e sair da zona de conforto” e que “o Bad Religion e o Punk Rock sempre foram sobre desafios”, Jay comparou o disco a uma “versão do American Lesion (disco solo de Folk Music de Graffin) com músicos melhores.

Encarte do CD (clique na foto para ampliar)
Foto de divulgação da banda na época do disco
Chega de papo! Vamos às músicas!

TRACKLIST
O play, que tem pouco mais de 40 minutos divididos em 13 faixas, abre com a vigorosa e otimista “You’ve Got a Chance” trazendo guitarras nervosas bem “na cara”, já destacando a produção bem límpida, cheia e otimamente timbrada, além de alguns efeitos diferentes e uma outra abordagem nas vozes de Greg.

Depois temos “It’s a Long Way to the Promise Land”. Honesta, pórem mais alegrinha e cadenciada, conta com vários “ohhhhz n’ ahss” no refrão e vários efeitos e filtros, como nunca se ouviu antes num som do BR. “Promised Land”, inclusive, chegou a ser cogitado para ser o título do álbum, mas a música, de fato, não traz aquela força digna de uma faixa-título de disco do Bad Religion.

“Melodia é a chave que vai te libertar!” este é o refrão da faixa 3, a esperançosa “A World Without Melody, que traz uma interessante introdução psicodélica de baixo e bateria e descamba para outro punk honesto e melódico, bem “up” e cheio de floreios das guitarras de Brian Baker, o que também se viu em muitos outros momentos do álbum.

capa do single New America
Na posição 4 está a faixa-título, primeiro single e mais poderosa música do disco, “New America”, com seu refrão épico e clima de hino de futebol! A letra (que começa com Greg gritando “Jimmy”, em referência ao vocalista da banda Punk inglesa Sham 69) é uma verdadeira intimação à mudança de paradigmas, naquele esquema de “já que somos a nova América temos que começar agir como tal”. Se a produção fosse mais roqueira, a cavalgada de uma das guitarras no verso seria mais nítida e a música com certeza ganharia um peso absurdo!

Apesar do single não ter emplacado, “New America” ganhou o único (e super divertido) clipe do álbum, onde dois meninos brincam de Punk Rock com bonequinhos da banda! Como parte da promoção do disco, o BR também apresentou a música ao vivo em um “late show” da TV americana (assista AQUI).

Assista ao divertido clipe de “New America”:

Em seguida, temos “1000 Memories”, uma das músicas mais subestimadas e também uma das mais pessoais da história da banda. Em sua letra, que foi brilhantemente encaixada num Hardcore Melódico típico do BR, Greg Graffin pôs pra fora, da maneira mais escancarada possível, as dores de seu recente divórcio: “Você era única, você era tudo. Nunca separados, nunca ninguém entre nós. Mas um dia, quando você foi embora, você se sentiu justificada e eu me senti mortificado!”

Greg gravando
Uma curiosidade: na tour do disco, no show da Argentina, quando tocaram essa música, algumas pessoas relataram que Greg estava com lágrimas nos olhos enquanto a cantava com raiva! No vídeo do show não fica claro, mas é possível ver que o vocalista realmente estava bem alterado! Mais sincero, impossível! E Punk e Hardcore sempre foram sobre sinceridade! ;)

Depois do “climão” da letra sobre divórcio, o BR amenizou as coisas com “A Streetkid Named Desire”, onde um nostálgico Greg Graffin canta sobre sua adolescência como punk rocker em Los Angeles. A música é, de fato, mais animada e pra cima, mas a super produção de Rundgren, com muitos overdubs de guitarra e a enxurrada de harmonias nos refrãos, diluiu todo o poder da música.

contra capa do CD
Whisper in Time” vem na faixa 7 carregando o estigma de ser a balada do disco. A música é bem legal, mas parece que foi tirada da carreira solo Folk de Greg Graffin. Brian Baker, com seu background Hard Rocker (além do Minor Threat, ele também integrou o farofento Junkyard antes do BR), aproveitou e se destacou com solos cheios de feeling, não muito típicos em um disco de Punk Rock.

E já que estamos falando de feelings, “Believe It” talvez seja o momento mais emocional do álbum, não pela música em si, que é, na real, bem fraquinha, mas pelo contexto de sua criação. Greg e Jay, quando planejaram (e depois abortaram) a idéia de fazer o “disco dos 20 anos do BR”, resolveram deixar as rusgas de lado e ligaram para Brett Gurewitz, convidando o ex-guitarrista para participar do disco.
Bonequinhos do Bad Religion do clipe de New America
Brett topou na hora, contanto que pudesse também compor, além de tocar, e o resultado foi “Believe It”, a única música que Greg não assinou sozinho no álbum. Já que a banda estava no Havaí, e Brett gravando o disco do Rancid em Los Angeles na época, o guitarrista gravou seu solo em um dos intervalos da produção e enviou diretamente para Rundgren encaixá-lo na música. Todos sabem que a partir dessa participação descompromissada acabou rolando a volta do guitarrista para a banda, mas esse assunto ficará para a próxima resenha!

Capa do single I Love My Computer
Outra tentativa de amaciar seu som e entrar nas paradas de sucesso foi o segundo single “I Love My Computer”. A letra foi super bem sacada, já que Greg ironizou, ainda no ano 2000, o distanciamento nas relações provocado pelo advento do computador e da internet, apimentando o tema com insinuações de “sexo virtual”. “Eu amo meu computador, ele ta sempre a fim, (...) Ele nunca pede por mais, podendo ser minha princesa ou minha puta. Nunca foi tão fácil! (...) Tudo que tenho que fazer é dar um clique pra gente se unir da maneira mais desalmada possível!” De tão Pop que era o acento da música, além de vários sons eletrônicos, pode-se ouvir algumas camadas de teclado tocadas por Graffin.

Assista “I Love My Computer” ao vivo, na TV:

Mantendo a dinâmica de equilibrar os climas de cada música, o play segue com a punk rockerThe Hopeless Housewife” e sua levada bem “Punk 77” que te convida ao pogo! A letra prega contra o marasmo, chamando os acomodados de “dona-de-casa conformada”. Já o som, mesmo com a produção exagerada, empolga bastante, sendo uma das melhores do disco, apesar de pouco explorada pela banda nos shows.

Foto do press release
Outra baladinha bonitinha com guitarras mais limpas vem em seguida, com o otimismo de “There Will Be a Way”. Apesar de sua sensibilidade, a música soa como um filler de fim de disco, assim como a mediana “Let It Burn”, que, apesar de ser outro convite punk à ação direta, e ter uma levada rápida com harmonias bem construídas (e uma super linha de baixo de Jay), não chega a empolgar. O baixo também é notado na introdução da música, com Jay fazendo um solo diretamente influenciado pelo The Who!

No final, temos a visceral “Don’t Sell Me Short”! Ela não é tão épica quanto outros encerramentos de disco do BR, mas é direta, melódica, bem elaborada e ótima pra cantar junto, tanto que foi usada pela banda para abrir os shows da turnê. Em suas versões europeia e japonesa, “The New America” ainda contava com dois bônus tracks: o Hardcore maravilhoso “The Fast Life” e a popzinha “Queen of the 21st Century”. Além delas, a banda gravou as medianas “Lose as Directed” e “Pretenders”, que foram usadas como B-Side nos singles.

TOUR
Outdoor do show de São Paulo
A “The New America Tour” teve 103 shows e durou de abril de 2000 até março de 2001. Nela, o Bad Religion foi convidado para abrir a turnê americana do Blink 182, tocando em grandes arenas, mostrando para a molecada de onde o trio de San Diego tirou seu lado mais Punk.

Aqui pra baixo, a perna sulamericana da tour aconteceu em março de 2001 e contou com seis apresentações, com um show na Argentina, outro no Chile e quatro gigs no Brasil (São Paulo dia 14, Curitiba dia 15, Rio dia 16 e Porto Alegre dia 18). No Brasil, eles participaram do programa “Uá-Uá” da MTV, cujo vídeo é encontrado em duas partes no YouTube (parte 1 e parte 2).

Assista ao show completo do BR na Argentina:

Uma entrevista com o baixista Jay Bentley ao portal Terra, durante a tour brasileira pode ser lida neste LINK.

FINAIS FELIZES
“New America” marcou o fim da fase do Bad Religion na Atlantic Records, onde estava desde 1993, quando o grupo abriu mão de sua independência e acabou experimentando seu maior sucesso comercial, se tornando uma banda popular e respeitada não apenas no underground.
Bobby Schayer gravando The New America
Também foi o último disco e última tour do gente-finíssima Bobby Schayer na bateria, que teve que se aposentar de tocar profissionalmente devido à uma lesão no ombro (provavelmente uma tendinite crônica). Essa condição pode ser notada em qualquer vídeo ao vivo do grupo, já que Bobby claramente não levanta seus braços acima dos ombros para atacar a bateria. Como o próprio Jay Bentley admitiu, a pegada de Bobby, que entrou no BR em 1991 e é um dos bateristas mais queridos pelos fãs, revolucionou o som da banda e levou eles a outro patamar sonoro. Sua performance em “New America” certamente é seu ápice como músico.

Poster de divulgação do disco
DEMOS
Sem dúvida nenhuma, “The New America” é o disco do BR que mais teve demos divulgadas no YouTube. Também deve ter sido o disco que o BR (leia-se Greg Graffin), mais se preparou antes de começar a gravar, já que dois sets de demos foram levados para o trabalho no estúdio. O primeiro tinha nove músicas gravadas por Greg sozinho em seu home studio, e o segundo tinha 12 sons gravados com a banda toda no estúdio, no Havaí.
Confira abaixo todas as demos divulgadas de “The New America”:

·                A World Without Melody

·                The Hopeless Housewife

·                New America

·                California (som inédito não incluso no disco)

·                The Fast Life

·                There Will Be a Way

·                A Streetkid Named Desire

·                1000 Memories

·                Whisper In Time

·                Believe It

Nota pessoal: “Lembro que esse CD chegou em minhas mãos ainda em 2000, emprestado pelo baterista da minha banda na época. Tocávamos alguns covers do BR, como “Do What You Want” e “Fuck Armageddon”, e eu perguntei empolgado: “e aí, tá legal esse?" Ele me respondeu; “pode ficar um tempão com o CD, porque é franquinho...” (risos)

Escute "The New America" na íntegra:

sábado, 11 de abril de 2020

Bad Religion 12 - No Substance (1998)

Nota: 6,5

Sabe quando você faz algo que deu muito certo e que te colocou numa posição de absoluto conforto? Sabe quando tudo está bem, mas tão bem, que você até relaxa, quase botando tudo a perder? Tudo indica que foi o caso aqui, no “No Substance”, 10º disco de estúdio do Bad Religion, lançado dia 5 de maio de 1998, o segundo pela major Atlantic Records!

O frisson que seu antecessor, “The Gray Race”, de 1996, causou na cena, fez com o próximo passo de Greg Graffin e companhia já fosse esperado com empolgação um ano antes, tanto que “No Substance” figurou na lista dos 25 lançamentos mais aguardados pela Alternative Press ainda em 1997!

E surfar na crista da onda também deixou Doctor Graffin bem empolgado já que ele havia dado conta do recado como único compositor da banda após da traumática saída de Mr. Brett anos antes, mantendo os níveis de popularidade do Bad Religion. Tamanha empolgação o inspirou o suficiente a compor, gravar e lançar seu primeiro disco solo, “American Lesion”, ainda em 1997, em novembro. O cantor aproveitou todo seu background e fez um inesperado disco de country/folk, onde ainda incluiu a versão original de “Cease” (que saiu no Gray Race), tocada no piano.

Escute "American Lesion", de Greg Graffin, na íntegra:

Com essa empolgação toda, a banda acabou deixando para compor o que viria a ser “No Substance” apenas no estúdio, logo antes de começar a gravar, decisão que, segundo Greg foi proposital. “Eu queria fazer como fazíamos no passado, tendo todo mundo no estúdio para arranjar todas as músicas juntos, como uma banda”, justificou. “É como se fosse 1981 novamente.”

Uma das contra-capas
Para viabilizar a empreitada, eles decidiram gravar o material no próprio home studio de Graffin, o Polypterus, em Ithaca (NY). “Foi como dar rolê na casa do Greg de novo, só que sem a mãe dele lá”, brincou o guitarrista Greg Hetson. “A idéia era fazer uma música por dia. Começávamos às 10h, depois de Greg nos servir umas panquecas, e íamos até às 5 ou 6 da tarde”, revelou o baixista Jay Bentley.

A banda começou a gravar em junho de 1997 e terminou tudo em fevereiro de 1998. A bateria e o baixo acabaram sendo gravados no Pyramid Studio, outro estúdio disponível em Ithaca, e apenas as guitarras e vocais acabaram sendo registrados no Polypterus, de Greg. A produção ficou a cargo da própria banda, junto com os calejados Alex Perialas e Ronnie Kimball.

Foi o disco que levou menos tempo para ser composto e gravado da banda, onde nem mesmo uma pré-produção foi feita, e a mixagem e masterização duraram apenas umas poucas semanas. “Não queríamos pensar muito”, revelou o guitar Brian Baker no press release do disco. De fato, “No Substance” soa como um disco pouco elaborado, até certo ponto “desleixado”, onde as músicas não possuem nada em comum. Não tinha aqueles lampejos do que o Bad Religion sempre soube fazer bem: Hardcore com velocidade e muitas melodias empolgantes, pra se cantar junto nos shows. E eles até tentaram...

Jay, Bobby, Graffin, Hetson e Brian no encarte do CD
PLAYLIST
Os quase 42 minutos de som de “No Substance” começam com a direta e certeira “Hear It”, um hardcore-três-acordes curto e grosso, cheio de energia, bem “Bad Religion”, que acabou sendo lançada como single e figurou bastante nos shows da tour do disco. Uma das melhores do play, sem dúvida!

A cadenciada “Shades of Truth” vem na sequência, com ótimas melodias e backing vocals certeiros. A música é bem construída, na pegada da consagrada “Infected”, do “Stranger Than Fiction”, mas fica maçante em 4 minutos de duração – uma das extensas da carreira da banda. O play segue com a mediana “All Fantastic Images”, composta por Greg em parceria com Brian Baker. De fato, o que mais se destaca na música são justamente os solos do guitarrista.

Na faixa 4 temos outro single do álbum, “The Biggest Killer in American History”. A música é tão desleixadamente simplista e sem punch, que imagino que quem a escolheu como single devia ser aquele “executivo da gravadora” que não manja nada de Punk Rock! A letra cita o “cientista” desenvolvedor de bombas na segunda guerra mundial Edward Teller, mas, de acordo com Greg Graffin, o “maior assassino na história americana” é o próprio exército do país.

Greg e Campino
No Substance” continua com a faixa-título na posição 5, outro Punk Rock cadenciado que, se fosse mais “explorado” pela própria banda, poderia ganhar mais moral. A música tem um refrão catchy, mas nunca chegou a ser tocada ao vivo, mesmo sendo o título do álbum, o que é um desrespeito à tradição do Bad Religion de sempre ter faixas-título fortíssimas entre seus sons mais clássicos, figurando em seus shows.

O sexto som “Raise Your Voice” talvez seja o mais conhecido do álbum! Seu “fa fa fafa fa fa fafá” é descaradamente pegajoso e é repetido à exaustão durante toda a música! Nem mesmo a participação do vocalista Campino, da banda alemã Die Toten Hosen (a Alemanha é onde o BR vende mais discos desde sempre), dividindo os versos e o refrão com Greg Graffin ajudou a melhorar a música, que chega até ser meio bobinha, com arranjos bem juvenis.

Capa do single Raise Your Voice
A letra, apesar de (sempre) inteligente, é uma versão diluída do principal moto que permeia a maioria das composições do BR, com aquela pegada “não siga nenhum líder”. Graffin disse em entrevistas que a escreveu depois de ver na TV que uma clínica de abortos tinha sido atacada por religiosos e dois funcionários chegaram a ser assassinados pelos fanáticos.

A gravadora, vendo essa aura Punk-Pop (ou Poppy Punk?) em “Raise Your Voice”, resolveu investir e a música ganhou duas versões de single – sendo uma lançada na Europa antes do lançamento do disco, com uma capa que Greg odeia – e um vídeo-clipe, o único que foi gravado para promover o disco. A filmagem, que contou com a participação do alemão Campino entre outros 20 atores, aconteceu no Hotel Ambassador, em Los Angeles, e foi dirigida pelo também alemão Kai Sehr.

Assista ao vídeo de “Raise Your Voice”:

A excelente “Sowing the Seeds of Utopia dá continuidade ao disco com bastante vigor e uma letra chute-na-cara dos políticos, viciados apenas em poder e não em ajudar. Um tema batido, mas que sempre estará em voga, não importando a época. Na faixa 8 vem a fraca e alegrinha “The Hippy Killers”, que chegou a ser cogitada como título do disco, mas não passa de ser um filler.

Foto oficial da era "No Substance"
E já que as letras são tão importantes para o Bad Religion, por que não fazer outra música-discurso? Eis que daí surgiu “The State of the End of the Millennium Address”, parceria de Greg Graffin com Brian Baker fazendo uma espécie de continuação de “Voice of God is Government”, que saiu no primeiro disco “How Could Hell Be Any Worse?”, de 1982. A grande diferença é que, enquanto "Voice..." tem um refrão e explode num vigoroso hardcore, "The State..." é apenas um discurso com uma trilha sonora tensa e repetitiva, sem chegar em um ápice! 

A partir desse ponto, o disco entra no seu momento mais obscuro, com seis fillers fraquíssimos em sequência: “The Voracious March of Godliness”; “Mediocre Minds (composta de uma parceria incomum de Greg Graffin com Greg Hetson); “Victims of Revolution” (outra que Greg fez com Baker), Strange Denial(único som que teve uma demo gravada, em 1994, e que acabou sendo descartado de dois discos anteriores); “At The Mercy of Imbeciles” (uma parceria tripla inédita na composição de Graffin, Baker e Hetson);  “The Same Person” (outro trio inédito na composição: Graffin, Baker e Jay Bentley).

E sabe aquela tradição do BR de encerrar seus discos com faixas épicas e melódicas? Por sorte, foi seguida à risca aqui, com a esplêndida “In So Many Ways” e seu refrão lindo de chorar cantando junto! Essa é uma das músicas mais criminosamente subestimadas da carreira da banda, tanto por eles mesmos, como pelos fãs. Diria que seu potencial melódico se equipara a pérolas como “You” e “Skyscraper”. Na versão japonesa, a gravadora incluiu “Dream of Unity”, já conhecida por ter figurado no ao vivo “Tested”, lançado um ano antes.

Poster de divulgação do disco
Para a capa, escolheram uma foto de uma modelo sexy aparecendo em um anúncio de telesexo numa televisão. De acordo com Greg Graffin, significava que “a sociedade estava corrompida pela TV e pela moda, com foco apenas no exterior, no que não tem conteúdo (ou substância), e não em valores importantes (interior).”

TOUR
A “No Substance Tour” durou quase um ano, com 95 shows em oito pernas, de abril de 1998 até março de 1999. Rendeu incríveis cinco datas no Brasil em março de 1999, sendo duas em São Paulo (dias 9 e 10, no Olympia), uma em Santos (dia 11 – um show antológico que começou às 2h da manhã, depois de quase ser adiado por conta de um temporal que ocasionou um apagão na cidade), outra em Curitiba (dia 12) e outra no Rio de Janeiro (dia 13). O único show fora do Brasil nessa perna sul-americana da tour foi em Santiago, no Chile, no dia 14.

Assista ao show completo do BR no Chile, em 1999:

Com poucas faixas que salvaram a lavoura e uma pegada bem desleixada, que deixava transparecer sinais de cansaço na banda, “No Substance” é tido como um dos pontos baixos da carreira do Bad Religion pela maioria dos fãs. O próprio baixista Jay Bentley já revelou em entrevistas que considera o disco “terrível”, no contexto da discografia da banda.
BR na Warped Tour 98
Ainda assim, o disco acabou relançado pela Epitaph Records, em 15 de setembro de 2008, quando a banda recuperou e relançou todo seu catálogo pela gravadora de seu guitarrista, Brett Gurewitz.

Escute "No Substance" na íntegra: