Nota: 9
Taí um resumo perfeito de “The Process of Belief”, o 12º disco de estúdio do Bad Religion, lançado em 2002, pela gravadora original da banda, a Epitaph Records. A história desse disco começou um ano antes, em 2001: após um hiato de sete anos, o guitarrista, fundador, compositor e dono da própria Epitaph Records, Brett Gurewitz, acertou sua volta para a banda e a retomada da parceria com o vocalista Greg Graffin na composição. Essa volta já havia sido ensaiada no disco anterior, “The New America”, de 2000, quando os dois compuseram juntos a faixa “Believe It”.
Brett Gurewitz |
Greg: “Brett, você gostaria de escrever e gravar o próximo disco do Bad Religion e voltar pra banda que você sempre pertenceu?”
Brett: “Sim, e você e o Bad Religion gostariam de voltar para a Epitaph, de onde vocês nunca deveriam ter saído?”
Pronto! O “Bad Religion Clássico” estava de volta!
COMPOSIÇÃO
Antes
mesmo de assinarem contratos e anunciarem oficialmente a retomada da parceria,
Greg e Brett se trancaram em seus estúdios caseiros e começaram a compor,
trocando arquivos de Pro-Tools e discutindo as idéias das músicas. Quando eles
se encontraram pessoalmente foi apenas uma questão de decidir quais músicas
usariam no disco e começar a trabalhar juntos nelas. Ficou muito claro que os
dois tinham em mente fazer um disco
clássico do Bad Religion, com músicas rápidas, melódicas, contestadoras e inteligentes!
Greg Graffin e Mr. Brett ao vivo |
Foi muita rasgação de seda mesmo! (rs)
NOVO BATERA
Mais ou
menos na mesma época, em junho de 2001, o Bad Religion foi atrás de um novo baterista para substituir Bobby Schayer, que, após 10 anos na
banda, havia lesionado seu ombro de maneira permanente, ficando impossibilitado
de tocar profissionalmente.
A banda
fez audições com cinco bateras. Entre eles, um jovem magrelo de 24 anos, mas com
um currículo pesadíssimo, que incluía passagens por bandas como Suicidal Tendencies, Infectious Grooves e The Vandals, chamou a atenção!
O nome dele: Brooks Wackerman.
Segundo relatos, após tocarem apenas duas músicas juntos, a banda afirmou que ele era “o melhor batera que eles já ouviram tocar!” Brooks, por sua vez, aceitou prontamente o convite, sem hesitar!
GRAVAÇÃO
Contracapa |
Como
o Pro-Tools estava em voga na época (e
foi usado de cabo-a-rabo no disco), o som do novo Bad Religion reunido acabou
ficando bem “digital” e moderno, até polido demais, o que tirou um pouco o punch das músicas (que ainda
assim se sobressaíram pela qualidade das composições).
Os backing vocals, principalmente, uma das características mais marcantes do Bad Religion, deixaram de soar naturais pelas evidentes correções de afinação e dobras feitas pelo programa de computador. Curiosamente (e infelizmente), essa nova timbragem mais moderna e digitalmente maquiada atingida em “TPOB” acabou sendo a referência para todos os discos da banda que vieram depois dele.
TÍTULO E CAPA
O
nome “The Process of Belief” (“o processo
da crença”) veio da letra da música “Materialist”, de Greg Graffin, onde o
vocalista versou sobre ser um materialista, no sentido de existir em um corpo
composto por matéria física, que existe de verdade. “O nome também reflete o
momento que vivíamos na época, onde confiávamos plenamente uns nos outros como uma
banda para fazer o melhor disco que pudéssemos”, explicou o cantor.
Detalhe do encarte do CD (clique para ampliar) |
Detalhe do encarte (clique para amplar) |
LANÇAMENTO E RECEPÇÃO
A
intenção inicial da banda era lançar o disco em outubro de 2001, mas a data
acabou sendo postergada para 5 de fevereiro de 2002. Para não perder mais
tempo, eles resolveram antecipar tudo e o lançamento acabou sendo dia 22 de janeiro de 2002.
Logo de
cara, empurrado pela ansiedade dos fãs em frenesi pela volta de Mr. Brett,
“TPOB” estreou em 49º lugar na
parada Billboard 200, e em 1º lugar na Top Independent Albums, as maiores marcas da banda até então. O
primeiro single, a hoje clássica “Sorrow”,
que já tocava nas rádios americanas desde dezembro de 2001, acabou também
entrando nas charts, o que não acontecia desde “A Walk”, em 1996.
Assista ao vídeo do Press-Kit de "TPOB":
A crítica também recebeu o disco de
braços abertos, pipocando reviews positivos
em praticamente todas as mídias. “É como se fossem faixas perdidas do Suffer,
do No Control e do Against The Grain”, cravou o jornalista Jack Rabid no All Music. Já
Mr. Brett chamou sua obra de “o disco supremo do Bad Religion”. O território
perdido pelo fracasso comercial de seus dois discos anteriores, os irregulares “No Substance” e “The New America”, começava a ser tomado novamente, como indicavam as
vendas: “TPOB” já vendeu 220 mil
cópias até hoje!
Nessa época, Mr. Brett tinha “Epiphany” como sua música favorita composta por Greg Graffin no álbum. Já para o vocalista “The Defense” era a melhor faixa de Brett. E já que falamos das faixas, vamos para o Tracklist!
BR 2002: Brian, Jay, Greg, Brooks, Brett e Hetson |
Se
você quer ouvir um disco clássico do Bad Religion, com certeza sua mente
imagina um álbum começando com pelo menos umas três músicas rápidas, fortes e
cortantes! É o que “TPOB” entrega: a trinca inicial é a talvez a mais bombástica
da carreira da banda, com “Supersonic”,
“Prove It” e “Can’t Stop” não deixando pedra sobre pedra, em pouco mais de 4 minutos e meio de música! Não é a toa
que a banda ainda toca as três músicas ao vivo até hoje, na mesma sequência do
disco!
“Supersonic”, composta por Brett, abre o
play com um riff frenético de
guitarra cheio de Fuzz e descamba para um Hardcore rápido e melódico, como só o
BR sabe fazer! A letra provoca o
modo de vida ansioso e urgente do mundo, onde tudo está funcionando numa
velocidade supersônica. A faixa acabou sendo o quarto e último single lançado para promover o disco,
no fim de 2002.
Já
“Prove It” é uma composição bem
característica de Greg Graffin, sendo um Punk Rock de riffs rápidos, frases
cheias de palavras cantadas à velocidade da luz e uma letra contestando o fanatismo religioso.
E
a trinca de abertura se completa com a velocíssima “Can’t Stop”, um Hardcore insano composto por Brett numa pegada bem oitentista, trazendo outra letra criticando o modo frenético de
viver da sociedade moderna. A música também funciona como um cartão de visitas de Brooks Wackerman, mostrando que agora a
banda tinha um baterista vigoroso e que gostava de tocar Hardcore rápido. Muito
rápido!
Capa do single de "Broken" |
Apesar
da sonoridade “feliz”, a letra
escrita por Mr. Brett fala sobre quando o guitarrista foi condenado a seis meses de prisão por posse de drogas, mas conseguiu
trocar a pena por um ano na reabilitação.
“Quando voltei, uma pessoa amada disse que eu estava ‘acabado’, mas eu acho que
justamente esse tipo de falha na vida nos faz mais humanos. A letra fala sobre
isso”, justificou.
“Broken” foi o segundo single do álbum, e, além de ser bastante tocada ao vivo na tour do disco, ganhou um vídeoclipe simples e honesto, bem eficiente, gravado no mesmo dia e local do clipe de “Sorrow”, pela equipe da Mindfield and Co.
Assista ao vídeo
de “Broken”:
Começando
com um clássico “Ya-Hey!”, na
faixa 5 temos a empolgada (e empolgante) “Destined For Nothing”, outro Punk Rock simples e direto cheio de coros vocais,
composta por Graffin, com letra
criticando as intuições sugestionadas pelas religiões. A já citada “Materialist” vem na sequência, com riffs
cromáticos urgentes e uma linha de voz cheia de fôlego, com mil palavras
cantadas por segundo por Greg, quase sem intervalo pra respirar entre os versos
e o refrão!
A
próxima é “Kyoto Now!”, uma crítica direta de Greg Graffin ao
governo norte-americano por não assinar o Protocolo de Kyoto sobre a emissão de gases no planeta. Muito executada ao vivo, a
faixa abre com um riff de música tradicional japonesa e descamba para outro Hardcore rápido e certeiro, com melodias
lindas e uma construção harmônica bem elaborada, típica do vocalista.
CD Single de "Sorrow" |
E
mesmo com toda essa aura de clássico,
a construção de “Sorrow” é ridiculamente simples, tendo apenas quatro acordes (Dó, Ré, Mi menor e Sol),
como em qualquer bom Punk Rock! Prova cabal que Brett estava incrivelmente
inspirado quando a compôs, apesar de que uma de suas especialidades sempre foi
fazer uns punk rock maravilhosos com poucas notas!
Como já foi mencionado, “Sorrow” foi o primeiro single do álbum e seu videoclipe é bem similar ao de “Broken” por ter sido gravado na mesma sessão e pela mesma equipe.
Assista ao clipe
de “Sorrow”:
Equilibrando novamente o disco com uma necessária desacelerada, a balada hard rocker “Epiphany”, de Greg Graffin, surge em seguida com seu riff de baixo marcante (composto por Greg, mas melhorado pelo baixista Jay Bentley) e seu refrão forte e perfeito pra cantar junto nos shows! Brian Baker deve ter lembrado de seus tempos de “Hard Rock” no Junkyard ao executar o interessante riff de guitarra após o refrão!
“Epiphany”
é, de fato, diferente de tudo que o BR já tinha feito até então, e serviu como uma
ótima oportunidade para os membros mostrarem que estavam em seu ápice como instrumentistas, além de
dispostos a explorar outras possibilidades de se expressar, mas ainda dentro da
esfera do Punk Rock. Pura evolução
musical!
CD Single de "The Defense" |
A
próxima, “The Lie”, apesar da “letra-lição-de-moral” de Graffin, não passa
de ser um filler, sendo a mais fraca
do disco, mesmo entre as músicas que ficaram de fora do tracklist oficial. Ela
é seguida por “You Don’t Belong”, de Mr. Brett, certamente inspirada na “The Kids Aren’t Alright”, do Offspring,
já que a letra segue exatamente a mesma fórmula de citar personagens reais do
passado da banda, com a diferença que, aqui, no caso do BR, a letra é otimista. No entanto, a música não tem o
brilho, nem o gancho da música de Dexter
Holland e Cia.
Fechando o tracklist oficial de “The Process of Belief”, vem a inspirada e subestimada (pela própria banda) “Bored and Extremely Dangerous”. Em sua letra, Graffin tentou entrar, de maneira dramática e poética, na mente de um dos atiradores do Massacre de Columbine: um estudante entediado, que sofria bullying e resolveu descontar sua raiva do mundo metralhando seus colegas de escola:
Punk-O-Rama 8 |
Na
edição japonesa, o álbum contou com a linda e épica “Shattered Faith” como bônus track. Com mais uma letra anti-religião composta por Greg,
ela é constantemente citada nos fóruns da banda pela internet como uma das mais
subestimadas do Bad Religion, tanto
por não ter entrado no tracklist oficial do disco, como por nunca ter sido
executada ao vivo. Realmente, uma judiação!
A banda também gravou a interessante “Who We Are”, de Mr. Brett, que acabou saindo como lado-B do single de “Broken”, e que só não entrou no tracklist, porque o guitarrista não ficou contente com a mixagem final. As duas acabaram figurando na “Punk-O-Rama 8”, um ano depois, em 2003.
CD Promo de "TPOB" |
De
fato, quando decidiram fazer mais um álbum clássico em suas carreiras,
motivados, principalmente, pela retomada da amizade e da parceria criativa, Greg Graffin e Brett Gurewitz não
brincaram em serviço e entregaram o melhor
e mais “sangue-no-zóio” disco do Bad Religion do novo milênio até os dias de
hoje.
Apesar da produção exageradamente polida, “The Process of Belief” marcou o início da atual fase do Bad Religion com sua coleção de músicas fabulosas, com muitos momentos épicos e marcantes, e mostrou que, mesmo após 22 anos de estrada (à época), a banda ainda tinha muita lenha pra queimar, se mostrando muito sedenta para retomar seu lugar no trono da elite do Punk Rock mundial. O patamar estava novamente elevado!
TOUR
O BR saiu em tour para promover “TPOB” no dia seguinte de seu lançamento, em janeiro de 2002, ficando na estrada até setembro de 2003. O ponto alto do giro foi a participação como atração principal na Vans Warped Tour 2002, que durou de junho até agosto, rodando os Estados Unidos de costa à costa.
BR na Warped Tour 2002 |
A obrigação contratual do BR |
Esse álbum realmente eh algo supremo. Assim como mencionado, até hoje não entendo como shattered faith não entrou no disco oficial e nunca foi tocada ao vivo. Em minha opinião ela eh a melhor de todas as músicas do tpob inclusive sorrow. Espero um dia ainda ver ela ao vivo.
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