Nota: 9,5
Capa de "Against The Grain" |
Após os marcantes e geniais “Suffer” (1988) e “No Control” (1989), discos que definiram uma nova estética para o Punk Rock e, consequentemente, ajudaram
a criar uma nova cena nos Estados Unidos (principalmente
na ensolarada Califórnia), o Bad Religion chegou a 1990
contabilizando um saldo mais que positivo, em termos de popularidade para uma
banda de Punk Rock independente que ainda não havia saído do Underground.
A fase estava tão boa, que eles
voltaram de sua última tour na Europa, no primeiro semestre do ano, com seu
primeiro VHS na mala: o único e
espontâneo “Along The Way”. Fruto de
um trabalho de estudantes de cinema que tinham uma produtora independente, a Tribal Area, “Along The Way” traz 28
músicas ao vivo, com áudio registrado de um show em Bremen (Alemanha),
intercaladas por entrevistas com a
banda, sendo a mais legal, uma com o guitarrista Mr. Brett falando abertamente sobre seu vício em crack!
Clique AQUI
para assistir o "Along The Way" completo no Youtube
VHS "Along The Way" |
A grande “curiosidade” do vídeo, que
foi lançado pela Epitaph Records (já falei que a gravadora é do guitarrista
Brett, né? rs) dia 25 de agosto de
1990, são as várias “trocas de roupa” dos integrantes durante as
músicas. Não que eles estivessem numa vibe de Madonna, mas a galera da produção
gravou e editou imagens de 14 shows
(!!!) diferentes e se esqueceu de pedir para que os integrantes usassem as
mesmas roupas... O resultado ficou próximo do cômico, como quando o vocalista Greg Graffin começa uma música com uma
camiseta azul, canta o refrão sem camisa e volta para o segundo verso com uma
blusa de frio vermelha... (rs)
Voltando um pouco no tempo, ainda
antes do lançamento do VHS, logo que o Bad Religion chegou da tour na Europa,
em maio de 1990, eles já tinham um
bom punhado de novas canções e nem hesitaram em entrar novamente no estúdio Westbeach Recorders (também do guitarrista Brett...), em
Hollywood, para registrá-las para seu próximo LP. E eles saíram de lá com uma
bolacha de pouco mais de 34 minutos
de Punk Rock rápido e ainda mais melódico, divididos em 17 músicas que iam direto ao ponto, sob o provocativo título “Against The Grain” (“contra a moda”, numa tradução livre).
O famoso "milho" no encarte do CD |
“Against The Grain”, o 5º full
length do Bad Religion, chegou às lojas no dia 23 de novembro do mesmo ano, via Epitaph Records (aqui no
Brasil, ele só foi lançado no fim dos Anos 90, em CD, pela Roadrunner Records) e, apesar de ter sido o primeiro disco da
banda a atingir a marca de 100 mil cópias vendidas e conter seu primeiro
“protótipo” de hit, a pop pegajosa (e
muito legal) “21st Century (Digital Boy)”, acabou não sendo o trabalho
que fez o BR estourar no mainstream.
A arte da capa, que caiu como uma luva para o título, pode ter
colaborado um pouco para esse “insucesso” do disco, já que o desenho lindão da
“lavoura de mísseis” da artista plástica Joy Aoki (responsável por capas de outras
bandas da Epitaph na época, como Offspring,
NOFX e Down By Law), apesar de se sustentar por si só pela mensagem contida,
não trazia nem o logo da banda, nem o nome do play, nem nada mais, itens que,
por mais que “estragassem” a arte, certamente aumentariam o apelo do marketing da
bolacha na prateleira das lojas.
Encarte do K7, com as "fotos produzidas" dos integrantes (clique para ampliar) |
Ainda dentro do contexto “contra a moda”, o encarte trouxe pela primeira vez os integrantes em fotos individuais, mas devidamente
“produzidos”, como se estivessem prestes a entrar numa passarela para desfilar
(!!!). Uma sacada espertíssima e muito corajosa para uma banda inserida na cena
Punk...
Outra novidade contida em “ATG”
foi a colaboração do baixista Jay
Bentley e do guitarrista Greg Hetson
na composição. Desde a volta da banda em 1987, apenas Greg Graffin e Mr. Brett
se arriscavam na criação, mas desta vez o baixista trouxe duas músicas: o
petardo hardcore de 57 segundos “The Positive Aspect of Negative Thinking” (que tem até uma batida “thrash
metal” no final) e a contestadora “Unacceptable”,
composta em parceria com Hetson. As duas músicas foram mixadas por Karat Faye, ao
contrário do resto do disco, que acabou finalizado por Eddie Schreyer,
engenheiro de som parceiro do guitarrista Brett no Westbeach Recorders.
Arte original de "Against The Grain" decorando o hall de entrada da Epitaph |
E se em “No Control” Brett era o
mais inspirado na hora de compor, em “ATG” Greg Graffin dischavou, trazendo 9
músicas contra 6 do guitarrista. “É sobre
como você desafia as estruturas da Ciência e da Arte para fazer progresso”,
comentou o cantor sobre o conteúdo lírico do álbum, em entrevistas na época do
lançamento. De fato, o “doutor” estava realmente inspirado quando escreveu
letras como as de “God Song”, “Faith Alone” e “Get Off”.
Assim como a capa, a contracapa não trazia informações |
Musicalmente,
“Against The Grain” também mostrou o Bad Religion evoluindo dentro do estilo
melódico de Punk Rock que havia inventado e desenvolvido, com Brett, Hetson e Jay
tecendo linhas diferentes um do outro na mesma musica pela primeira vez, como
em “Anesthesia” (surrupiada pelo Offpsring quatro anos mais tarde, na música "Genocide", do Smash), por exemplo, ao
invés de simplesmente se acompanharem na mesma base, como ocorreu em
praticamente todo material anterior da banda. Finalmente o BR estava utilizando
as vantagens de ter duas guitarras no time!
Nas “drums and percussion” (como
creditado no encarte do album), apesar de ainda bem “retão”, Pete Finestone manteve a precisão e a
pegada forte que sempre apresentou, neste disco que foi seu último nas baquetas
do Bad Religion, encerrando um ciclo de 3 álbuns com a mesma formação na banda.
Vinil amarelo de "Against The Grain" |
Como já havia
virado uma tradição o BR abrir seus discos com uma cacetada, “ATG” começa com
Greg Graffin mandando um “... here’s a
song with attitude” (mas o começo da
frase foi cortado na edição do disco...), seguido de Finestone contando “1,
2, 3, 4” pra descer o sarrafo em “Modern Man”. A música, um hardcore de poucos acordes, muita melodia e muitos coros
de “Oozin Ahs” (como eles sempre chamaram os backing vocals nos
encartes), começa com um solo simples, porém marcante, de Bret e cai na
brilhante letra contestadora de Graffin sobre o way of life destrutivo do homem moderno, a quem ele chama de “traidor da evolução”.
O lado A do
vinil segue a mil por hora com as rapidíssimas hardcores “Turn On The Light” (com um solo de baixo), “Get Off” (com um solo de “oozin ahs”),
“Blenderhead” e a já citada “The Positive Aspect of Negative Thinking”, até cair na interessante “Antesthesia”,
composta por Brett.
Poster oficial da tour de "Against The Grain" |
Além de clássica
na discografia da banda, “Anesthesia”
é um caso a parte, tanto pelo quesito musical, com linhas de guitarra espertíssimas
e uma quebrada de tempo maneira no final com algumas percurssões, como pela
fantástica letra, com 3 metáforas
embutidas (!!!), que conta a historia de um casal, que ora você acha que se
envolve com assassinato e suicídio, ora que eles estão apenas usando heroína,
além de uma outra metáfora passeando entre essas duas, onde a “Anesthesia”, alem de ser o nome da
garota, é uma gíria para a droga, já usada por Brett, que considerou a canção
uma de suas favoritas na banda.
Ainda no lado A,
o play segue com “Flat Earth Society”,
também de Brett, famosa por seu refrão simplório “Lie, Lie, Lie...” e por sempre estar no set list dos shows, até terminar
na cadenciada e também clássica “Faith Alone”, de Greg, onde o cantor fez o nome da banda fazer muito jus a sua
mensagem, com uma letra desconcertante de tão sincera e contestadora.
Depois de chutar
a porta de novo na abertura do lado B com a veloz “Entropy”, temos a faixa-título
com sua base solada, algo pouquíssimo usual no Punk Rock, e sua letra
autoafirmativa panfletária “I maintain
against the grain”. O “sprint na descida” segue com a alta (em termos de
tom) “Operation Rescue”, que conta
com backing vocals do Keith Morris,
famoso por integrar bandas como Black Flag, Circle Jerks e Off!, colada com a melodiosa “God Song”, onde Greg mais uma vez bate
forte nas ditas religiões que fazem o fiel vender até a casa pra pagar o dízimo...
Cartaz do 1º show da tour, no México |
Então, mesmo
depois de te dar 12 bordoadas na orelha, o BR ainda te entrega o já citado hit “21st Century (Digital Boy)”, composta
por Brett sobre a família-padrão norte americana:
“Sou uma criança do século 21, não sei
ler, mas tenho muitos brinquedos, meu pai é um intelectual desmotivado de
classe média e minha mãe é lesada de Rivotril”. Um clássico incontestável do
Bad Religion com todos os méritos!
E essa letra ainda
veio embalada numa base cheia de groove, que sempre causa o maior pula-pula nos
shows da banda até hoje. Era tanto potencial Pop, que, quando o BR assinou contrato com uma gravadora major, mais tarde em 1994, uma das cláusulas
do contrato os obrigava a regravar essa música pra lançá-la novamente com um
clipe e tudo mais, como aconteceu no disco “Stranger Than Fiction”!
E ATG entra na reta final com a
correta “Misery and Famine”, seguida
da já citada “Unacceptable” e da “pogativa”
“Quality or Quantity”, com sua
alternância de ritmo entre o Punk 77 e o puro HC, acabando de vez com “Walk Away”, cheia de “oozin ahs”.
Bad Religion, no México, durante o 1º show da tour |
O disco, mesmo contando algumas das letras mais ácidas do Bad Religion, tinha tanto potencial melódico e pop em suas veias, que o tecladista Roy Bittain, da The E Street Band, banda de apoio de Bruce Springsteen, apareceu um dia na Epitaph para conversar com Brett e Jay, oferecendo uma maleta cheia de dinheiro para que eles regravassem “Against The Grain” com ele na produção, dizendo que assim eles estourariam! Jay acabou “educadamente expulsando” o maluco da reunião, sem dar nenhuma resposta à absurda proposta, para logo depois cair na risada junto com Brett, mal acreditando no que havia acabado de acontecer...
Apesar de tantas músicas brilhantes,
“Against The Grain” manteve a máquina do Bad Religion rodando bem graças à
força do hit “21st
Century (Digital Boy)”, que fez a banda deixar de apenas “dividir” o palco com seus colegas da
cena Punk americana, para a se tornar a “atração
principal” na maioria das noites da tour, que novamente contou com um giro
pela Europa, além dos Estados Unidos e México, e durou até 1992, quando eles lançaram “Generator”,
o próximo disco a ser resenhado. Até lá! :)
Escute “Against The Grain” logo abaixo:
* Bônus: versões demo de 7 músicas
de “Against The Grain” estão disponíveis no Youtube! :D
Clique sobre os títulos para ouvir:
- Get Off
Grato pela resenha, que por sinal foi muito bem feita.
ResponderExcluirValeu pela resenha, duas observações, eu tenho uma versão do ATG que tem o nome da banda bem discreto na frente, deve ter sido uma versão especial ou algumas poucas e entendi mas mesmo assim acho que o surrupio do Offspring foi bem feito em Genocide, pois acho o solo inspirado, mas bem diferente de Anesthesia. hahahahah
ResponderExcluirLegal essa sua versão! E o surrupio do Offspring foi muito válido mesmo! Genocide é uma baita música!
ExcluirBaita resenha, meus parabéns!
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